Desde que ascendeu ao papado, em 2013, o Papa Francisco tem caminhado por uma corda bamba. Aclamado por progressistas e atacado por conservadores, ele se encontra agora, ironicamente, sob o fogo de ambos os lados. No início, seu discurso de uma Igreja mais inclusiva e sensível às dores do mundo trouxe esperança a muitos. Mas à medida que o tempo passou, aqueles que ansiavam por mudanças profundas começaram a impacientar-se, acusando-o de avançar devagar demais — um “novo conservadorismo” aos olhos de alguns.
O episódio mais recente que ilustra essa tensão ocorreu na visita do Papa à Universidade Católica de Lovaina, onde uma carta de professores e estudantes criticou sua lentidão em lidar com temas como desigualdade social, crise climática e o papel das mulheres na Igreja. A resposta do Papa Francisco, exaltando a importância do “sim” de Maria no acontecimento salvífico e reiterando que a identidade da mulher não é sancionada por consensos ideológicos, foi vista por muitos como insuficiente. Logo após seu pronunciamento, a universidade emitiu um comunicado lamentando “as posições conservadoras” do Papa.
A situação é emblemática do dilema enfrentado por Francisco. Os conservadores o atacam desde o início, acusando-o de diluir a doutrina católica com suas iniciativas de maior abertura. Eles criticam suas ações, como a decisão de permitir a participação de mulheres no Sínodo dos Bispos, considerando-as um desvio perigoso das tradições seculares. Já os progressistas, que outrora o apoiaram com fervor, agora começam a virar as costas, frustrados com o ritmo lento das reformas. Para eles, a recusa em abordar de maneira mais incisiva temas como o sacerdócio feminino e a igualdade de gênero na hierarquia eclesiástica é uma traição às expectativas geradas nos primeiros anos de seu pontificado.
O que poucos parecem entender é que Francisco nunca prometeu revoluções abruptas. Seu método é mais orgânico e processual, consciente de que as mudanças reais e duradouras, especialmente em uma instituição com dois milênios de história, não acontecem da noite para o dia. O Papa opera com uma lógica que privilegia o diálogo, a construção de consensos e a paciência. Como ele mesmo enfatizou, “não é o consenso nem são as ideologias que sancionam o que é característico da mulher”. Em vez de ceder às pressões externas para mudanças rápidas, ele aposta em uma reforma gradual que, embora lenta, tem a chance de ser mais robusta e sustentável no longo prazo.
A grande ironia é que, ao insistirem em mudanças imediatas, tanto conservadores quanto progressistas deixam de valorizar os avanços significativos já realizados. O Papa Francisco tem introduzido mulheres em posições de destaque na Igreja, algo que seria impensável sob outros pontificados. Ele tem aberto o diálogo sobre temas que antes eram tabus e colocou a Igreja em sintonia com questões contemporâneas cruciais, como a preservação do meio ambiente e a necessidade de justiça social.
No entanto, a frustração é compreensível. A Igreja Católica, com sua tradição enraizada em séculos de patriarcado e hierarquia, parece uma instituição imutável para muitos que esperam que ela se adapte ao século XXI com mais agilidade. Mas é preciso lembrar que a força das grandes instituições está justamente em sua capacidade de resistir a mudanças superficiais e precipitadas. A missão de Francisco, ao que parece, é iniciar processos que se desenrolarão ao longo do tempo — muito além de seu próprio papado.
Aqueles que esperam mudanças rápidas e dramáticas ainda não compreenderam a lógica do Papa. Ele não está buscando satisfazer um lado ou outro, mas transformar a Igreja a partir de suas próprias raízes, com um ritmo que, embora frustrante para alguns, tem o potencial de gerar reformas profundas e duradouras. A história da Igreja mostra que as grandes revoluções internas não acontecem em anos, mas em décadas, ou até mesmo séculos.
Os extremos tocam-se, como dizem. E, enquanto conservadores e progressistas tentam puxar a Igreja em direções opostas, Francisco continua a trilhar um caminho singular — nem rápido, nem lento demais, mas no ritmo certo para que as sementes que ele planta floresçam no futuro.
Padre Carlos