Em 1978, eu tinha 18 anos e vivia a efervescência de um Brasil que já não suportava mais a ditadura, suas amarras e seu autoritarismo. O pacote de abril daquele ano, um instrumento de controle desenhado para sustentar o poder dos governantes e calar as vozes dissonantes, era um obstáculo que nós, da militância política, não poderíamos aceitar. O país vivia sob o regime do bipartidarismo – um limitador explícito que restringia a expressão política ao MDB e à ARENA, sufocando qualquer possibilidade de pluralidade ideológica. Foi sob esse contexto que mergulhei em minha trajetória política, junto à Tendência Popular, em busca de um Brasil livre e democrático.
Com o endurecimento das regras do colégio eleitoral e a criação dos “senadores biônicos”, a revolta se intensificava entre os militantes. Afinal, as decisões políticas mais importantes eram conduzidas a portas fechadas, e o povo não tinha voz nem escolha real. Em 1979, em plena Boca do Rio, em Salvador, participei ativamente no Centro de Convenções em defesa de uma UNE popular e inclusiva, uma UNE que pudesse representar não só estudantes, mas o jovem negro, o pobre, o excluído. Perdi essa batalha, mas ganhei, junto com tantos outros, a certeza de que o caminho da luta era árduo, mas necessário.
O movimento estudantil daquela época foi um impulso vital, mas o surgimento do sindicalismo operário no ABC Paulista trouxe uma mudança estrutural no nosso país. A classe operária – até então invisível para as elites políticas e econômicas – começou a mostrar sua força e capacidade de articulação. O surgimento de lideranças como Luiz Inácio Lula da Silva não foi um acaso; foi o reflexo de uma sociedade que clamava por justiça social, dignidade e oportunidade para todos. A industrialização do Brasil, especialmente com o fortalecimento da indústria pesada e da indústria química, havia criado uma base operária sólida, mas carente de direitos e representação. Esse levante dos trabalhadores e o surgimento do Partido dos Trabalhadores foram os verdadeiros pontos de virada para o nosso país.
Os anos seguintes trouxeram desafios ainda maiores, especialmente com a campanha das Diretas Já, onde milhões de brasileiros tomaram as ruas clamando pelo direito ao voto direto, pelo poder de escolher os rumos de nossa nação. A campanha das Diretas e, mais tarde, a Assembleia Constituinte, não foram apenas momentos históricos; foram a expressão da resistência popular e do desejo de mudança. A Constituinte de 1988, com a participação ativa e engajada de diversos setores da sociedade, consolidou a jovem democracia brasileira, materializando o anseio de tantos que, como eu, passaram anos lutando para que o país deixasse de ser controlado por uma minoria.
Minha trajetória política, ao lado de tantos outros companheiros, é uma prova viva de que a luta pela democracia e pela justiça é um compromisso sem trégua. Resgatando esses episódios, reafirmo que nossa resistência não foi em vão. Hoje, apesar das adversidades, podemos dizer que se temos democracia, é porque o nosso povo resistiu. Em cada esquina, cada praça e cada centro de debates, houve vozes que se levantaram, punhos que se ergueram, e uma certeza que nos manteve de pé: o Brasil só será verdadeiramente livre quando cada um de seus filhos puder viver em paz, com dignidade e respeito. Essa é a minha trajetória, essa é a minha luta – e é nela que continuo, acreditando em um país mais justo, mais plural e mais democrático.