Política e Resenha

ARTIGO – Militares Indiciados por Golpe: O Exército Realmente Defende a Democracia? (Padre Carlos)

 

 

 

 

A recente conclusão do inquérito policial militar indiciando três coronéis por incitação à indisciplina e por tentar coagir o Exército em direção a um golpe é, sem dúvida, um marco. Anderson Lima de Moura, Carlos Giovani Delevati Pasini e José Otávio Machado Rezo Cardoso são acusados de disseminar a ideia de desobediência contra o comando das Forças Armadas, visando pressioná-lo a se opor à posse de um presidente eleito democraticamente. Apesar de a investigação ser uma reação saudável do Exército, o caso traz à tona um antigo dilema: até que ponto a disciplina militar serve como escudo para condutas que afrontam diretamente os princípios democráticos?

A Gravidade das Acusações e a Persistência da Cultura do Golpe

Os crimes atribuídos aos três coronéis envolvem a pressão por um golpe militar — um ato de incitação que, em qualquer estado democrático consolidado, seria enfrentado com severidade. Contudo, as penas aplicadas, que variam entre dois meses e quatro anos de prisão, parecem estar longe da gravidade das ações cometidas. A punição desproporcional reforça a ideia de que as instituições militares ainda não deixaram para trás a cultura da impunidade, legado dos anos de regime autoritário.

Um personagem que não se pode esquecer neste cenário é Almir Garnier, ex-comandante da Marinha, mencionado em investigações que apontam conversas sobre a adesão ao golpe. A delação do tenente-coronel Mauro Cid à Polícia Federal acrescenta uma camada inquietante a essa trama, ao relatar encontros entre Jair Bolsonaro e líderes militares para discutir uma intervenção golpista. Isso nos revela uma estratégia organizada, não apenas isolados rompantes de insatisfação. A proposta de obstruir a posse de um presidente é um recado claro sobre as persistentes ameaças que a democracia brasileira enfrenta, mesmo em instituições que deveriam defendê-la.

O Papel Ambíguo das Forças Armadas na História Brasileira

É fundamental recordar que as Forças Armadas brasileiras sempre mantiveram uma presença política ambivalente. Seu histórico de intervenções nos impele a uma vigilância reforçada sobre seu papel no Brasil atual. Em 2022, a tentativa de golpe — ainda que frustrada — reacende questões essenciais sobre o compromisso das Forças Armadas com a democracia e a vontade popular.

Ao investigar e indiciar esses coronéis, o Exército mostra um primeiro esforço de resposta, embora tímido, ao exigir responsabilidade. Mas se o julgamento destes oficiais não for rigoroso, enviará um sinal de que militares que infringem a lei podem continuar a escapar de punições severas. A democracia exige respeito à ordem constitucional; qualquer concessão à indisciplina é perigosa e sugere que a democracia ainda não está consolidada dentro dos muros das instituições militares.

Resposta Institucional e o Imperativo da Transparência

Este inquérito também nos coloca diante da necessidade de um debate maior e mais transparente sobre a atuação das Forças Armadas. A opinião pública merece — e exige — transparência total para que episódios de ameaça e tentativas de golpe sejam tratados com o peso que merecem. Sem isso, há o risco de que essas atitudes se transformem em um hábito reiterado dentro das forças de segurança, cuja lealdade deve estar, antes de tudo, à Constituição e ao povo brasileiro.

A tentativa de golpe em 2022 e as tentativas de defesa destes militares indicam que a impunidade pode prevalecer. A confiança pública depende de uma resposta institucional que reafirme o compromisso da caserna com a democracia e a disciplina, mas sobretudo, com uma postura não-partidária que fortaleça as instituições brasileiras.

Conclusão: Entre a Justiça e a Democracia

A conclusão deste inquérito é um momento decisivo para a democracia brasileira. Reforça o desafio de manter a democracia como uma responsabilidade partilhada entre civis e militares, onde ninguém está acima da lei. O Brasil precisa romper de vez com as sombras do autoritarismo, que ainda pairam, e assegurar que todos — sejam civis ou militares — respondam adequadamente por seus atos em defesa da ordem constitucional.

Esse episódio serve de alerta: se o país deseja avançar, precisa extirpar de suas instituições qualquer resquício de conivência com ideias antidemocráticas.