Política e Resenha

A Revolução de Francisco: Uma Ressurreição para a Igreja e os Pobres

 

 

A eclesiologia, essa palavra que pode parecer estranha à primeira vista, é na verdade o coração pulsante da vida cristã. Trata-se da reflexão teológica sobre a Igreja, sua identidade, missão e estrutura, uma reflexão que molda o cotidiano dos fiéis e traça caminhos para a unidade cristã. Mas, em tempos de crise e desapontamento, quando essa missão parece desviada, muitos se perguntam: para onde está indo a Igreja?

Minha experiência pessoal reflete essa angústia. Por anos, servi à Igreja com paixão, oferecendo minha juventude e meu trabalho em prol de uma Igreja que se comprometesse com os pobres. As Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) representavam um sonho: um modelo de Igreja mais simples, mais próxima do povo, uma expressão viva do Evangelho de Cristo. No entanto, a visão parecia desmoronar diante de um projeto eclesial que abandonava os pobres, afastando-se das catacumbas e das periferias.

Em meio à decepção, ecoaram em meu coração as palavras de Ezequiel: “Nossos ossos estão secos, nossa esperança está morta; estamos perdidos.” Parecia o fim, até que um vento novo começou a soprar.

O Sopro de Vida de Francisco

O anúncio de Francisco ao papado foi como uma primavera inesperada. Ele veio não apenas como líder, mas como um samaritano, um pastor com o odor das ovelhas, carregando a cruz das dores do mundo. Sua mensagem de ternura e misericórdia despertou algo que parecia perdido. “Sou amado, logo existo”, proclamava ele com gestos e palavras, desconstruindo o individualismo cartesiano para reconstruir a dignidade humana sobre o fundamento do amor divino.

Francisco entendeu que a missão da Igreja não era acumular poder ou consolidar estruturas, mas curar feridas. Como o bom samaritano, ele nos chama a descer às noites escuras dos marginalizados, sem perder nossa essência, mas iluminando com a luz de Cristo.

Ano da Misericórdia: Um Novo Paradigma

O Ano da Misericórdia foi um marco dessa revolução. Para além de um evento simbólico, foi um sinal de uma mudança profunda. O Deus rigoroso e punitivo de tempos passados deu lugar ao Deus que acolhe e perdoa, que caminha com os pobres e marginalizados. Francisco nos lembrou que a misericórdia não é um intervalo na história da Igreja, mas o seu próprio coração.

Com isso, renovou-se a vocação da Igreja em ser um instrumento de humanização, uma ponte para o amor misericordioso do Pai. Como ele mesmo disse: “Devemos encarregar-nos das pessoas, acompanhando-as, lavando suas feridas e consolando-as.”

Uma Ressurreição para os Pobres e para a Igreja

Francisco não apenas ressuscitou a fé de muitos, mas também trouxe de volta a esperança de uma Igreja que luta pelos pobres e marginalizados. Ele reavivou em nós o espírito de missão, convidando-nos a assumir novamente o compromisso com o Evangelho.

A primavera de Francisco é um chamado à conversão contínua, um convite para que sejamos testemunhas vivas da misericórdia divina. É o reconhecimento de que, mesmo em meio a crises, Deus continua agindo, renovando nossa fé e nossa vocação.

Aqueles que, como eu, sentiram a decepção e o cansaço encontram agora razões para continuar. Como Dom Celso dizia, devemos caminhar com o povo, entrar em sua noite sem nos perder, sendo luz e presença viva de Cristo.

Francisco nos lembrou que a Igreja não pertence às elites, mas aos pobres, aos sofredores e aos marginalizados. Sua revolução é um apelo à simplicidade, à proximidade e à compaixão. Que não nos esqueçamos: somos chamados a ser Igreja em saída, portadora de esperança e construtora de pontes.

Amém!