Política e Resenha

ARTIGO – A ARTE DE OUVIR: UM RESGATE DA ESSÊNCIA HUMANA (Padre Carlos)

 

 

Vivemos em uma época marcada por avanços tecnológicos, comunicação instantânea e conexões virtuais. Contudo, em meio a esse turbilhão, surge uma ironia silenciosa: nunca estivemos tão conectados e, ao mesmo tempo, tão incapazes de ouvir. Esta  reflexão nos convida a revisitar o que significa, de fato, ouvir e a importância desse ato para a nossa humanidade.

 

Ouvir vai além da audição. É uma atitude de abertura ao outro e ao mundo, que exige atenção plena, empatia e, acima de tudo, silêncio interno. Contudo, como cultivar esse silêncio em um ambiente saturado de notificações, opiniões e ruídos? Quando foi a última vez que paramos para ouvir o bater do coração de quem amamos, o som do vento nas folhas ou, mais importante, a voz da nossa própria consciência?

 

A incapacidade de ouvir tem consequências profundas. Famílias desmoronam porque cônjuges não se escutam. Jovens se perdem porque pais estão ocupados demais para ouvir suas angústias. Governos tornam-se autoritários quando esquecem que a essência da democracia é o diálogo com os cidadãos. Em todos os âmbitos da vida, a surdez ao outro alimenta divisões, isolamentos e tragédias.

 

Além disso, há o ouvir transcendente, o que chamamos de escutar o Divino. Este não é apenas um exercício religioso, mas um movimento de introspecção e de busca por sentido. Quem ouve o silêncio encontra sabedoria, reconciliação consigo mesmo e com o mundo. Mas, diante de um “barulho ensurdecedor”, quem está disposto a se recolher e escutar?

 

O resgate da arte de ouvir requer esforço e contracultura. Significa desligar os smartphones para estar presente em uma conversa. Significa valorizar o diálogo, seja ele entre amigos, familiares ou opostos políticos. Significa, acima de tudo, reaprender a ouvir a melodia do invisível no visível: o sorriso de uma criança, o bater de asas de um pássaro, o marulho das ondas.

 

A solução não está em banir as tecnologias, mas em usá-las como ferramentas de conexão, não de alienação. Está em ensinar nossas crianças a ouvir, não apenas a falar. Está em relembrar que a linguagem é, antes de tudo, um ato de reciprocidade.

 

Ouvir é um ato revolucionário em um mundo que prioriza o ruído. Ao voltarmos à simplicidade de escutar, não apenas nos tornamos melhores seres humanos, mas resgatamos algo essencial: a capacidade de sentir e criar laços verdadeiros. Afinal, é no silêncio que as palavras de sabedoria se acendem.