É com profunda inquietação que observamos mais um capítulo na saga do desprendimento do Estado brasileiro com o bem-estar social de seus cidadãos. A revogação do SPVAT, sucessor do DPVAT, não é apenas mais uma decisão administrativa – é um golpe direto contra milhares de brasileiros que dependem dessa proteção nas tragédias do trânsito.
Como podemos aceitar passivamente que, em um país onde acidentes de trânsito ceifam vidas diariamente, o mecanismo de proteção às vítimas seja simplesmente descartado? A decisão parece ignorar completamente as famílias que, em momentos de profunda dor, encontravam nesse seguro um mínimo amparo financeiro para reconstituir suas vidas.
Mais perturbador ainda é observar o jogo político em torno das emendas parlamentares. O acordo que limita o contingenciamento apenas às emendas não impositivas revela uma priorização preocupante: R$ 5,9 bilhões que poderiam ser direcionados para áreas essenciais ficam agora blindados, não por necessidade pública, mas por conveniência política.
Os “gatilhos” aprovados para controle de gastos públicos são apresentados como solução, mas parecem ignorar uma questão fundamental: como garantir eficiência administrativa sem comprometer serviços essenciais? A limitação de 0,6% acima da inflação para crescimento de despesas com pessoal pode parecer razoável no papel, mas qual será o impacto real na qualidade dos serviços públicos?
O uso dos superávits dos fundos nacionais para abater a dívida pública merece especial atenção. São R$ 18 bilhões acumulados em fundos que têm propósitos específicos e fundamentais. O Fundo de Defesa dos Direitos Difusos, por exemplo, com seus R$ 2 bilhões de superávit, deveria estar financiando projetos de proteção ao consumidor e ao meio ambiente, não servindo como instrumento de ajuste fiscal.
Contudo, nem tudo está perdido. Este momento exige uma mobilização consciente da sociedade civil. Precisamos:
- Exigir transparência total na aplicação desses recursos e seus impactos sociais
- Acompanhar de perto a tramitação no Senado, pressionando por ajustes que preservem mecanismos de proteção social
- Cobrar estudos técnicos que demonstrem o impacto real dessas medidas na vida dos cidadãos
É hora de transformar nossa indignação em ação cidadã. Precisamos questionar nossos representantes, participar ativamente das discussões públicas e propor alternativas que equilibrem responsabilidade fiscal com proteção social. O Brasil que queremos não se constrói com o desmonte de mecanismos de proteção social, mas com gestão eficiente e compromisso real com o bem-estar da população.
A esperança reside na nossa capacidade de mobilização e no poder transformador da democracia participativa. Que esta decisão sirva não como fim, mas como início de um debate nacional sobre que tipo de proteção social queremos para nosso país. O futuro da nossa segurança social está em jogo, e não podemos nos dar ao luxo da omissão.