É angustiante testemunhar como nos contentamos com remédios que apenas aliviam os sintomas da nossa doença social crônica. O sistema atual de transferência de renda, embora necessário no momento presente, tornou-se uma armadilha que nos impede de enfrentar o verdadeiro desafio: a construção de uma nação verdadeiramente desenvolvida e justa.
Nossa tragédia não está apenas na pobreza atual, mas na aceitação silenciosa de que ela será permanente. Enquanto países ao redor do mundo investem maciçamente em educação transformadora e desenvolvimento produtivo, o Brasil parece ter se conformado com a mediocridade de ser eternamente o país do futuro, contentando-se em oferecer migalhas aos pobres e privilégios aos ricos.
É revoltante perceber como abandonamos o projeto original de Cristovam Buarque, que vislumbrava a transferência de renda como uma ponte para a emancipação através da educação. Em seu lugar, construímos um sistema que, embora vital para milhões de famílias hoje, tornou-se uma âncora que nos prende ao subdesenvolvimento. Não por má intenção, mas por falta de ambição e compromisso com mudanças estruturais.
A perversidade dessa situação está em sua aparente benevolência. Sim, o Bolsa Família salva vidas hoje – e deve continuar fazendo isso. Mas onde está o projeto de nação que tornará esse programa desnecessário para as próximas gerações? Onde está o investimento massivo em educação pública de qualidade? Onde está o compromisso com a geração de empregos dignos e produtivos?
Nossa elite política e econômica parece satisfeita em administrar a pobreza, em vez de eliminá-la. É mais conveniente manter milhões de brasileiros dependentes de auxílios do que enfrentar o desafio hercúleo de transformar nossa estrutura social e econômica. Esta é uma escolha covarde e moralmente indefensável.
Precisamos de uma revolução educacional que vá além dos números de matrículas. Nossas escolas públicas precisam se tornar centros de excelência, com professores valorizados e infraestrutura de primeiro mundo. O investimento em educação básica de qualidade não é gasto, é o único caminho para nossa libertação coletiva.
Simultaneamente, precisamos de uma política industrial robusta que gere empregos dignos e produtivos. Não podemos aceitar que nossos jovens tenham como única perspectiva de futuro a dependência de programas assistenciais. Eles merecem e precisam de oportunidades reais de desenvolvimento profissional e pessoal.
O momento exige uma mobilização nacional. Não podemos esperar que as soluções venham apenas de Brasília. Cada cidadão, cada empresa, cada instituição precisa assumir sua parte na construção de um Brasil que não precise de programas de renda mínima permanente porque terá conseguido criar uma economia dinâmica e inclusiva.
Se continuarmos no caminho atual, em 2045 ainda estaremos discutindo como aumentar o valor do Bolsa Família, em vez de celebrar sua obsolescência por termos finalmente construído uma sociedade desenvolvida. Esta é uma perspectiva que deve nos causar profunda indignação e nos mobilizar para a ação imediata.
O Brasil que sonhamos não é utópico – é possível. Mas para alcançá-lo, precisamos ter a coragem de romper com o conformismo atual e exigir – nas urnas, nas ruas e em cada espaço de poder – um projeto de desenvolvimento que vá além dos paliativos. Nossa indignação precisa se transformar em ação concreta por mudança.
A escolha é nossa: continuaremos administrando a pobreza ou teremos a coragem de enfrentá-la e vencê-la? O futuro cobra essa resposta de cada um de nós.
Padre Carlos