A aviação civil não é apenas uma ponte entre céus e terras; é um eixo vital para o desenvolvimento de cidades que, como Vitória da Conquista (BA) e Campina Grande (PB), ocupam posições estratégicas em suas regiões. Recentemente, Campina Grande enfrentou um dilema que ecoa em muitas localidades do interior do Brasil: a redução de voos da Azul Linhas Aéreas, decorrente de uma reestruturação nacional da empresa. A resposta da cidade paraibana, porém, transformou-se em um caso exemplar de governança colaborativa — um modelo que Vitória da Conquista pode (e deve) adaptar para fortalecer sua própria rede aérea e economia.
Campina Grande: A lição de que união gera solução
Quando a Azul anunciou a diminuição de operações no Aeroporto Presidente Castro Pinto, Campina Grande não se limitou a lamentar. Sob a liderança da Secretaria de Desenvolvimento Econômico (SEDE), a cidade mobilizou um amplo espectro de atores: do setor turístico (PBTUr) à Associação Comercial, passando por órgãos estaduais. O objetivo era claro: dialogar com a empresa para mitigar impactos e buscar alternativas que mantivessem a cidade conectada aos grandes centros.
Em entrevista à Rádio Caturité FM, a secretária Tamela Fama resumiu a estratégia: “Entendemos que essa é uma situação complexa, mas não intransponível. Estamos trabalhando em conjunto com entidades públicas e privadas para preservar nossa conectividade, que é essencial para atrair investimentos e gerar emprego”. A fala de Fama sintetiza um princípio fundamental: em tempos de crise, a resposta eficaz nasce da articulação entre poder público, iniciativa privada e sociedade civil.
Vitória da Conquista: Riscos e oportunidades no horizonte
Vitória da Conquista, terceira maior cidade baiana, vive realidade semelhante. Seu aeroporto, Pedro Otacílio Figueiredo, não é apenas uma estrutura de concreto e asfalto: é um catalisador econômico. Por ali passam turistas rumo à Serra do Piripiri, produtores rurais que escoam grãos e frutas, pacientes que buscam atendimento médico especializado e estudantes que frequentam a Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB). Uma eventual redução de voos — seja por decisão empresarial, como ocorreu na Paraíba, ou por falta de demanda — representaria um retrocesso para toda a região, que abrange mais de 80 municípios.
O paralelo com Campina Grande salta aos olhos: ambas são polos regionais cujo crescimento depende da capacidade de manter e ampliar sua integração com o resto do país. A diferença é que Vitória da Conquista ainda tem tempo de agir antes que uma crise se instale.
Três passos para Conquista decolar
Inspirado na experiência paraibana, o caminho para a cidade baiana pode ser traçado em três eixos:
1. Governança colaborativa: Criar um comitê permanente envolvendo a Secretaria Municipal de Desenvolvimento, entidades empresariais (como ACIVC e CDL), universidades (UESB), sindicatos rurais e representantes do governo estadual. Esse grupo teria a missão de monitorar a operação aérea, identificar gargalos e negociar diretamente com companhias, apresentando dados concretos sobre demanda potencial (como o fluxo de 50 mil passageiros/ano no aeroporto).
2. Incentivos inteligentes: Campina Grande pressiona por benefícios fiscais e operacionais para atrair voos; Conquista pode ir além. Uma proposta ousada seria articular com o governo baiano a redução de impostos estaduais (como o ICMS) para combustível de aviação no aeroporto, medida que já impulsionou operações em cidades como Recife e Fortaleza. Paralelamente, é possível buscar parcerias com empresas locais para garantir receita mínima às companhias (mecanismo usado com sucesso em Joaçaba/SC).
3. Marketing territorial integrado: Nenhuma companhia aérea resiste a rotas lucrativas. Cabe a Conquista provar que seu aeroporto é viável. Como? Unindo promoção turística (divulgando eventos como o São João e Festival de Inverno e outras festas) a campanhas que destaquem o potencial econômico da região — como o agronegócio do cacau e o polo de saúde. Um exemplo a ser copiado é o de Juazeiro do Norte (CE), que aumentou voos após associar sua imagem ao turismo religioso e a feiras de negócios.
Inovar para não parar: Ideias além do óbvio
Além de replicar o modelo de Campina Grande, Vitória da Conquista tem espaço para ousar:
- Rotas regionais compartilhadas: Articular com cidades vizinhas (Jequié, Itapetinga, Brumado) a criação de um consórcio intermunicipal para subsidiar voos regionais, dividindo custos e ampliando a malha aérea.
- Aeroporto como hub logístico: Modernizar a infraestrutura para atrair empresas de e-commerce e transporte de cargas, aproveitando a localização estratégica da cidade entre o Nordeste e o Sudeste.
- Parcerias público-privadas (PPPs): Buscar investimentos para ampliar o terminal de passageiros e melhorar serviços, tornando o aeroporto mais competitivo.
Conclusão: O céu não é o limite
A crise em Campina Grande ensina que, mesmo diante de políticas nacionais, o poder local não é refém. Vitória da Conquista, que já é um centro de referência em saúde, educação e agronegócio, tem todas as condições de transformar seu aeroporto em um vetor de desenvolvimento — desde que suas lideranças adotem a mesma postura proativa dos paraibanos.
Como bem disse Tamela Fama, “a missão é garantir desenvolvimento”. Para isso, é preciso enxergar a conectividade aérea não como um custo, mas como um investimento. Afinal, em um país de dimensões continentais como o Brasil, cidades que não dialogam com o céu dificilmente alcançarão o horizonte.