A Bahia tornou-se um laboratório político do Partido dos Trabalhadores. Enquanto o PT nacional ainda depende da sombra de Lula para sonhar com o Palácio do Planalto, no estado nordestino o partido construiu uma máquina eleitoral quase imbatível, com cinco mandatos consecutivos e uma teia de alianças que desafia a clássica divisão entre esquerda e direita. Contudo, por trás dessa engenharia política meticulosa, esconde-se uma contradição: a vitória eleitoral não se traduz em desenvolvimento. A pergunta que se impõe é: até quando a eficácia nas urnas conseguirá mascarar a estagnação econômica e social?
A Engenharia de uma Hegemonia
O PT baiano é um caso raro de adaptação pragmática. Desde que Jaques Wagner quebrou a sequência de governos conservadores em 2006, o partido soube costurar alianças com setores da direita democrática, como PP,MDB e mais tarde PSD, sem perder a identidade ideológica. Essa flexibilidade permitiu consolidar uma base estável, mesmo em meio a crises nacionais, como o impeachment de Dilma Rousseff e a prisão de Lula. A escolha estratégica de vices — muitas vezes figuras de perfil técnico ou de centro-direita — revela um cálculo preciso: fragmentar a oposição e neutralizar críticas sobre radicalismo.
O resultado é uma governabilidade impressionante. Gerônimo Rodrigues, o atual governador, herdou um projeto que já dura 18 anos, mas seu governo, assim como o de Rui Costa, parece pautado mais pela gestão administrativa do que por rupturas. “Governar com a caneta”, como descrevem analistas, significa priorizar o controle da máquina pública e acordos burocráticos em detrimento de grandes reformas. É uma estratégia que mantém o poder, mas não necessariamente o transforma.
A Crise por Trás dos Números
Se nas urnas o PT baiano é imbatível, nos indicadores socioeconômicos a realidade é menos gloriosa. A Bahia perdeu relevância econômica tanto no cenário nacional quanto regional. Salvador, outrora uma capital vibrante, hoje é uma cidade marcada pela pobreza e pela falta de perspectivas. O crescimento do PIB baiano está abaixo da média do Nordeste, e o estado não consegue atrair investimentos privados significativos.
A aposta em políticas sociais compensatórias — como programas de transferência de renda e ações pontuais em educação — substituiu a construção de um projeto de desenvolvimento integrado. Embora essas medidas tenham garantido apoio popular, elas são insuficientes para reverter a decadência estrutural. A “fadiga utópica” mencionada no texto reflete justamente isso: o PT já não mobiliza como antes a esperança de mudança, apenas gerencia a sobrevivência de seu projeto.
Sidônio e a Corrida Contra o Tempo
A ascensão de Sidônio ao Planalto, somando-se a Jaques Wagner e Rui Costa, poderia ser um trunfo para renovar o projeto petista. Sua experiência na área de infraestrutura e seu perfil técnico oferecem uma chance de reconectar o partido à agenda do desenvolvimento. No entanto, a pressão sobre ele é colossal. A Bahia não pode esperar: é preciso resgatar a economia, modernizar Salvador e frear o êxodo de jovens talentos.
O problema é que Sidônio herda não apenas a responsabilidade de mudar o jogo, mas também os vícios de um modelo esgotado. Desta forma só resta o trabalho de um marqueteiro que possa vender utopias, fazendo com que as aliança com a direita, embora eficaz eleitoralmente, não deixe a militância entender os limita a capacidade de inovar. Como promover reformas ousadas se o preço é desestabilizar a base de apoio?
A Oposição Inexistente e o Risco da Complacência
Enquanto isso, a oposição baiana vive um paradoxo inverso: tem motivos para criticar, mas falta competência para capitalizá-los. A migração de quadros para o governo — como ocorreu com alguns prefeitos, que preferiu negociar com o PT a confrontá-lo — revela uma crise de credibilidade. Sem discurso alternativo, a oposição permite que o PT governe sem medo de ser punido nas urnas por seus fracassos.
Isso cria um ciclo perigoso: a ausência de pressão externa reduz a urgência por resultados. O PT baiano, confortável em sua hegemonia, corre o risco de transformar-se em uma máquina de perpetuação no poder, desvinculada de qualquer projeto transformador.
Conclusão: A Hora da Verdade
A Bahia é um espelho distorcido do PT. Se, por um lado, o partido demonstra uma capacidade única de se reinventar politicamente, por outro, falha em converter essa força em progresso real. A chegada de Sidônio ao governo federal pode ser um sopro de oxigênio, mas não resolverá sozinha os problemas estruturais.
O desafio do PT baiano não é vencer 2026 — isso parece quase garantido —, mas responder a uma pergunta incômoda: de que serve governar há quase duas décadas se não se consegue alterar o destino de um estado? A resposta exigirá mais do que canetas e alianças. Exigirá coragem para romper com a zona de conforto da vitória fácil.
Enquanto isso, a Bahia segue como um paradoxo: um gigante eleitoral e um anão econômico. E o tempo, como bem lembra Sidônio, está se esgotando.