(Padre Carlos)
Hoje, ao receber de um amigo de infância e juventude uma velha fotografia dos coqueirais do Nordeste de Amaralina, algo pulsou dentro do peito — uma saudade que não tem nome, mas que todo homem maduro reconhece. Era uma paisagem simples, de terra batida, casas humildes e coqueiros que pareciam tocar o céu. Mas naquela imagem havia mais que um retrato: havia uma vida.
Aquele cinturão verde que se estendia do alto das Ubaranas à Santa Cruz era uma moldura natural para os dias boêmios, as primeiras paixões, os encontros de esquina e as conversas de calçada. Aqueles coqueiros — altos, serenos, imortais — nos vigiavam como sentinelas da infância e da juventude. E como esquecer o caminho entre o Alto da Alegria e o Nordeste de Amaralina? Ele não era apenas um trajeto, mas uma travessia de afetos e histórias.
Só quem nasceu nas décadas de cinquenta e sessenta pode entender o que foi viver ali. Sentir a maresia chegando com o vento da tarde, ouvir os cantos das lavadeiras ao longe, ver os moleques correndo descalços no barro quente. Era um tempo em que a liberdade não vinha do consumo, mas do convívio. Não tínhamos muito, mas tínhamos tudo. O mundo era menor, mas o coração era maior.
O coqueiral, hoje, talvez já não exista como antes. O progresso cobriu de concreto o que antes era terra e verde. Mas há coisas que a modernidade não consegue apagar: as lembranças, os cheiros, os sons e as emoções daquele tempo continuam vivos em nós, como a fotografia que me chegou hoje e que me fez, por instantes, voltar a ser menino.
Essa faixa de terra nos formou. E ao lembrar dela, lembro também que ainda há tempo de preservar nossas memórias, nossos afetos e nossa identidade. O Nordeste de Amaralina não é só um bairro. É um símbolo. E os coqueiros, mesmo que derrubados, ainda balançam dentro da gente.