(Padre Carlos)
A procissão de Ramos é mais que um rito: é um retrato fiel da humanidade em movimento rumo ao mistério da salvação. Caminhamos juntos, com nossos ramos erguidos, simbolizando festa, esperança, expectativa messiânica. Mas também caminhamos com a ambiguidade no coração, como quem louva num instante e condena no seguinte.
O Domingo de Ramos inaugura a Semana Santa com uma liturgia que é espelho da alma humana. A entrada triunfante de Jesus em Jerusalém, em meio a cantos e aclamações, é também o prenúncio de sua rejeição, dor e morte. Quem canta “Hosana!” hoje, amanhã gritará “Crucifica-o!”
A Campanha da Fraternidade de 2025, ao propor a “Fraternidade e Ecologia Integral” com o lema bíblico “Deus viu que tudo era muito bom” (Gn 1,31), recorda-nos que essa Casa Comum, que habitamos juntos, também está em marcha — ou rumo à vida, ou à autodestruição. Como disse o Papa Francisco na Laudato Si’, não estamos numa nova arca de Noé que salva alguns: salvamo-nos juntos ou pereceremos juntos.
Jesus entra em Jerusalém para entregar-se, não para ser celebrado. É a entrega total, não de algo que possuía, mas de si mesmo. Jerusalém é a metáfora do interior humano, lugar do conflito entre o desejo de Deus e as resistências mais profundas da alma.
Jesus chorou. Chorou por uma cidade que não compreendia o que lhe podia trazer a paz. Chorou por uma humanidade cega, incapaz de reconhecer a salvação quando ela lhe bate à porta. Chorou por nós.
O Domingo de Ramos nos obriga a olhar para dentro. Por que mudamos tão rapidamente de postura diante de Jesus? Por que a fé se transforma em frustração? Por que o amor vira ódio? Talvez a resposta esteja nos contrastes profundos do nosso próprio coração.
Três realidades nos atravessam:
-
A fragilidade do povo, facilmente manipulado por lideranças que escondem interesses inconfessáveis;
-
A cegueira dos poderosos, obcecados em manter seus tronos de areia;
-
A constância de Jesus, que não respondeu à violência com ódio, mas com silêncio, mansidão e amor.
O Cristo da paixão nos revela o humano em sua plenitude: sente-se abandonado, mas não abandona; é traído, mas perdoa; é negado, mas permanece fiel; é humilhado, mas não se rebaixa à vingança.
Sua obediência não nasce da submissão cega, mas da escuta atenta ao Pai. “O Senhor abriu-me os ouvidos”, diz o profeta Isaías. Jesus, o Filho obediente, revela que o caminho para a glória passa pela dor, e que a salvação se dá na comunhão, não na fuga.
Na sua cruz, estamos todos: com nossas negações, nossos silêncios cúmplices, nossos gritos injustos. Mas também com nosso desejo sincero de recomeço.
E é por isso que, ao final, toda língua proclamará: Jesus Cristo é o Senhor, porque na cruz brilhou o amor mais extremo, e o amor jamais será derrotado.