Minha primeira formação não foi o jornalismo – foi a filosofia. Mas nunca vi essas duas áreas como mundos distantes. Ao contrário: sempre senti que uma completava a outra. A filosofia me ensinou a ouvir o silêncio por trás das palavras; o jornalismo, por sua vez, me ofereceu os meios para dar voz a esse silêncio. Transformei essa escuta em texto, em interpretação, em narrativa.
A minha verdadeira escola, no entanto, foi – e continua sendo – a política. Foi ali, nesse terreno marcado por gestos calculados, palavras ensaiadas e silêncios eloquentes, que aprendi a ler o mundo. Foi na política que me formei como profissional e como pensador da realidade. Aprendi que cada frase de um líder, cada omissão de uma instituição, carrega muito mais do que aparenta. Tudo é sinal. Tudo comunica.
Escrever, para mim, nunca foi apenas uma atividade literária ou uma tarefa marcada na agenda. Escrever é uma forma de continuar ensinando – só que em voz baixa. É debater sem microfone, construir uma cátedra pública, onde a opinião não serve ao juízo apressado, mas à análise, à provocação e, acima de tudo, à memória.
Sempre fui atraído pelo mergulho. Gosto do que não se vê à primeira leitura. Me interessa o texto que escava, que interroga, que tenta entender não apenas o que aconteceu, mas por que aconteceu – e o que isso diz sobre nós como sociedade. Foi com esse olhar que escrevi sobre o movimento estudantil, tentando enxergar na juventude não só uma força de mobilização, mas uma consciência crítica em construção. E foi também com esse olhar que mergulhei na guerrilha do Araguaia, não para visitar uma página esquecida da história, mas para iluminar o silêncio imposto a ela.
Esses dois temas – a juventude em ebulição e a guerrilha em resistência – me inquietaram profundamente. Tão profundamente que um dia pensei: “isso ainda vai virar uma história”. E virou. Nasceu daí a vontade de escrever um romance, uma narrativa ficcional sobre um jovem que atravessa essas duas experiências. Uma forma de fazer com que o pensamento filosófico ganhasse carne, personagem, trama.
O artigo de opinião, nesse processo todo, tornou-se uma espécie de ensaio contínuo. Ele treina meu olhar, afia meu pensamento e me convida, semana após semana, a ouvir o país como quem lê um texto antigo: com atenção, respeito e suspeita. A filosofia política, que sempre foi minha lente preferida, me ensinou que nada é neutro. Nenhuma fala de um presidente, nenhum silêncio do Parlamento, nenhum gesto aparentemente banal de um vereador está isento de sentido. Tudo é linguagem. Tudo é contexto.
É por isso que sigo escrevendo. Porque ainda acredito que o texto pode ser trincheira – não da guerra, mas da lucidez. Num tempo marcado pela pressa, pelo ruído e pela desinformação, sigo apostando na escuta, no cuidado e na profundidade. A filosofia me deu o olhar. A política, a sensibilidade. O artigo é apenas o resultado inevitável de quem nunca quis – e nunca pôde – se calar.