(Padre Carlos)
O fim do regime militar em 1985 e o início da chamada Nova República abriram espaço para uma reconfiguração profunda das forças sociais no Brasil. Entre os atores centrais desse novo tempo, a classe trabalhadora emergiu com vigor, empunhando bandeiras de direitos, cidadania e participação política. Contudo, os avanços conquistados ao longo desse período foram tão significativos quanto ameaçados por retrocessos cíclicos e instabilidades estruturais do nosso país.
A Constituição de 1988 foi, sem dúvida, o marco inaugural de um novo patamar de direitos sociais e trabalhistas. Fruto direto da mobilização popular e da pressão dos sindicatos e movimentos sociais, a “Constituição Cidadã” garantiu jornada de trabalho limitada, direito à greve, ao seguro-desemprego, ao FGTS e ampliou as garantias trabalhistas para além da CLT, tornando o trabalhador um sujeito de direitos plenos. Foi uma vitória histórica.
Nos anos 1990, com a onda neoliberal e as privatizações, os trabalhadores enfrentaram uma conjuntura adversa. A flexibilização das leis trabalhistas e a precarização dos vínculos empregatícios marcaram uma fase de resistência. Ainda assim, sindicatos e movimentos populares não desapareceram. Pelo contrário: amadureceram, tornaram-se mais estratégicos e aprenderam a dialogar com a institucionalidade, como se viu nas eleições de lideranças oriundas do movimento sindical.
Nos anos 2000, sob os governos que se reivindicavam de esquerda, houve novas conquistas. O salário mínimo passou por valorização real, programas como o Bolsa Família e o Pronatec deram suporte às camadas mais vulneráveis da classe trabalhadora, e o crescimento econômico com inclusão social reacendeu o sonho da mobilidade. Trabalhadores passaram a frequentar universidades públicas, adquirir casa própria e a ocupar espaços simbólicos antes restritos às elites.
No entanto, o ciclo se quebrou. As reformas trabalhistas de 2017, sob o pretexto de “modernização”, dissolveram importantes garantias. A pejotização, o trabalho por aplicativos e os contratos intermitentes criaram um novo proletariado digital sem a mesma proteção legal. Hoje, a classe trabalhadora enfrenta uma nova forma de exploração: invisível, algorítmica e fragmentada.
Apesar disso, há motivos para esperança. A juventude trabalhadora ressignifica o conceito de trabalho, experimenta novas formas de organização e ressurge em lutas por direitos urbanos, ambientais e digitais. A memória da luta, construída ao longo da Nova República, continua viva.
A classe trabalhadora não é apenas uma categoria econômica. É um sujeito histórico, consciente de si, e capaz de reinventar sua luta a cada ofensiva do capital. Seu maior avanço, talvez, não esteja apenas nas leis conquistadas, mas na capacidade de resistência que demonstrou ao longo de quatro décadas.
Hoje, mais do que nunca, é preciso recordar: não há democracia sólida sem trabalho digno, sem justiça social, sem valorização daqueles que constroem, com as mãos e o suor, a riqueza desta nação.