(Padre Carlos)
Em meio à solenidade vaticana e aos ritos ancestrais que remontam aos alicerces da cristandade, a Igreja Católica se prepara para um de seus momentos mais solenes e imprevisíveis: o conclave. A reunião dos cardeais, em clausura e sob sigilo rigoroso, para escolher o sucessor de Pedro, é talvez o único evento religioso que conjuga o peso da tradição com o sopro do imprevisível.
Como dizia meu professor de Latim, Padre Bruno: aventurar-se a prever o resultado de um conclave é um exercício que pode beirar a vergonha. E com razão. A história está repleta de surpresas papais, onde nomes improváveis emergiram das sombras para assumir o trono de São Pedro, como se o Espírito Santo – ou a astúcia humana – decidisse pregar uma peça nos que ousaram antecipar o desfecho.
O conclave, cuja origem remonta à necessidade de pressionar os cardeais indecisos a eleger um papa, ainda carrega o espírito tenso da incerteza. A evolução das normas, como o voto secreto desvinculado da assinatura, reflete não apenas o zelo pela liberdade de consciência, mas a tentativa de blindar a eleição contra forças externas e internas que sempre rondaram a Igreja.
Há algo de teatral e profundamente humano nesse processo. O suspense cultivado pelas comitivas, os disfarces para despistar curiosos e o tradicional “Habemus Papam” declamado da sacada da Basílica de São Pedro compõem um espetáculo que o mundo acompanha com os olhos vidrados. E quando o eleito surge – muitas vezes alguém que não figurava nas listas dos especialistas –, não raro a surpresa revela mais sobre a lógica interna do colégio cardinalício do que sobre qualquer cálculo externo.
Os bastidores, narrados nos diários póstumos de cardeais, revelam uma Igreja viva, pulsante, feita de alianças, desentendimentos, hesitações e acenos de unidade. Conclaves como o de João Paulo II, que rompeu paradigmas ao trazer um papa de além da Cortina de Ferro, ou de Bento XVI, cuja eleição simbolizou continuidade teológica, mostram como a história da Igreja se reescreve em cada escolha.
Mas não sejamos ingênuos. A santidade do processo não elimina suas contradições. Por trás das paredes sagradas do Vaticano, há também ambições pessoais, interesses geopolíticos e articulações de poder que fazem do conclave algo mais do que um evento espiritual. É também um momento humano, demasiado humano.
Em Vitória da Conquista, Bahia, onde a fé se entrelaça com o cotidiano sertanejo, observamos o rito romano com reverência e um pouco de fascínio. A fumaça branca que emergirá da chaminé da Capela Sistina não trará apenas um novo papa, mas um novo tempo para uma Igreja que se equilibra entre sua herança milenar e os ventos de mudança.
No enigma do conclave, tradição e surpresa caminham juntas. E talvez, como nas grandes narrativas bíblicas, a voz de Deus continue a se manifestar nas escolhas menos óbvias, nos caminhos não previstos, nos nomes que surpreendem. Porque o sagrado, por vezes, se esconde naquilo que menos esperamos.
Então, diante da perda, escolho celebrar a vida. Escolho honrar a memória daqueles que foram vivendo plenamente, amando profundamente e sendo grato por cada novo dia. Afinal, a morte pode levar corpos, mas nunca pode extinguir o amor e as lembranças que deixam para trás.
Que possamos, juntos, abraçar a efemeridade da vida e encontrar significado na jornada, mesmo nas perdas mais dolorosas. Que possamos aprender com a finitude e viver de maneira autêntica, conectada com o que é realmente importante. Pois, no final, o que realmente importa não é quanto tempo temos, mas como escolhemos viver o tempo que nos é dado.