O tema da universalidade da Igreja é um dos mais importantes e desafiadores para os cristãos de hoje. Como pode a Igreja ser fiel à sua missão de anunciar o Evangelho a todas as nações, respeitando a diversidade cultural e religiosa dos povos? Como pode a Igreja ser uma comunhão de irmãos e irmãs, sem cair no etnocentrismo ou no relativismo? Como pode a Igreja ser sinal e instrumento do Reino de Deus, que abraça toda a humanidade e toda a criação?
Estas questões não são novas, mas ganharam uma nova urgência no contexto atual, marcado pela globalização, pela migração, pelo pluralismo e pelo diálogo inter-religioso. A Igreja, desde o seu nascimento, vive em contextos multiculturais e multirreligiosos, nos quais é essencial o compromisso de diálogo entre religião e cultura. O Concílio Vaticano II, na sua declaração Nostra Aetate, afirmou que a Igreja “reconhece, estima e promove os valores espirituais, morais e sociais que se encontram nas diversas religiões” e que “exorta os seus filhos a que, com prudência e caridade, dialoguem e colaborem com os membros das outras religiões, dando testemunho da fé e da vida cristã” (NA 2).
O Papa Francisco, na sua encíclica Fratelli Tutti, reforçou esta mensagem, ao afirmar que “a Igreja valoriza a ação de Deus nas outras religiões, e ‘não rejeita nada do que nelas existe de verdadeiro e santo'” (FT 277). O Papa também destacou a importância do encontro fraterno com os crentes de outras tradições religiosas, como fez em Abu Dhabi, em 2019, ao assinar o Documento sobre a Fraternidade Humana, juntamente com o Grande Imã de Al-Azhar, Ahmad Al-Tayyeb. Nesse documento, os dois líderes religiosos declararam que “Deus quer que todos os homens e mulheres sejam irmãos e irmãs, que vivam como tais, formando a grande família humana na harmonia da diversidade” (DFH 1).
A Igreja, portanto, é chamada a ser uma Igreja de toda a tribo, língua, povo e nação, como diz o livro do Apocalipse, que apresenta uma visão profética da multidão dos redimidos, que louvam a Deus e ao Cordeiro, cantando: “Digno és de tomar o livro, e de abrir os seus selos; porque foste morto, e com o teu sangue nos compraste para Deus de toda a tribo, e língua, e povo, e nação” (Ap 5,9). Esta é a vocação e a missão da Igreja, que se realiza na história, através do testemunho, do serviço, do diálogo e da comunhão.
Um dos teólogos que tem refletido sobre este tema é o dominicano português Frei Bento Domingues, que escreve regularmente no jornal Público. Em um dos seus artigos, publicado em 5 de novembro de 2023, ele comentou o relatório da primeira assembleia do Sínodo dos Bispos, que teve como tema “Por uma Igreja sinodal: comunhão, participação e missão”. Frei Bento elogiou o documento, que apresenta as convergências, as questões e as propostas dos participantes do Sínodo, e destacou alguns pontos que considerou importantes, como a valorização da colegialidade episcopal, a participação dos leigos, especialmente das mulheres, a reforma da Cúria Romana, a sinodalidade como estilo de vida e de missão, a atenção aos pobres, aos migrantes, aos jovens, aos indígenas, aos perseguidos, aos excluídos, a defesa da ecologia integral, o diálogo com as outras Igrejas cristãs, com as outras religiões e com a cultura contemporânea. Frei Bento concluiu o seu artigo dizendo que “o Sínodo é uma oportunidade para a Igreja se renovar e se abrir ao mundo, como uma Igreja de toda a tribo, língua, povo e nação”