No cotidiano da medicina moderna, uma verdade desconcertante se revela: os médicos parecem ter perdido os cinco sentidos. Vivemos em um tempo em que a tecnologia domina a prática médica, o que poderia ser positivo, mas, em muitos casos, trouxe consequências desastrosas para a relação médico-paciente. Os sentidos que, outrora, eram o alicerce de um diagnóstico preciso e sensível – visão, audição, tato, paladar e olfato – parecem ter sido abandonados, sufocados pela dependência quase total dos exames e máquinas.
Nos idos anos cinquenta, médicos como meu amigo Dr. Antonio Sturaro, ainda em atuação aos 93 anos, baseavam-se não em uma tela de computador ou em uma série de exames complexos, mas em suas próprias habilidades sensoriais. O médico de outrora enxergava o paciente como um todo, usava o olhar atento, o toque cuidadoso, o ouvido perspicaz para captar a essência da doença. Ele sabia que um diagnóstico eficaz podia ser sentido, cheirado, ouvido, e até visto – como no caso do diabético, cujo hálito apresenta um odor suave de maçã, ou do hepático, cuja pele amarelada denuncia um problema de bilirrubina.
Dr. Sturaro é uma prova viva da medicina humanista, aquela que não se limita a números e imagens, mas que investiga a história do paciente, respeitando suas experiências e ouvindo com atenção suas queixas. Esta prática, que gera vínculo e confiança, é um dom que se afasta, substituído pela frieza dos diagnósticos prontos e das prescrições impessoais.
O uso excessivo de exames em detrimento do toque humano cria uma medicina automatizada, desprovida de sensibilidade. O médico hoje, ao ouvir “dor abdominal,” muitas vezes já encaminha o paciente para tomografias e ressonâncias, sem mesmo ouvir os detalhes da história clínica. Essa inversão não só desumaniza a prática, como retira do paciente a chance de ser compreendido em sua totalidade.
Os diagnósticos, hoje, são complementares aos exames de laboratório, mas é preciso lembrar que a base da medicina é a relação humana. Quando a escuta cuidadosa e a análise minuciosa da pessoa desaparecem, a essência do diagnóstico clínico também desaparece. Médicos como Dr. Sturaro nos lembram que a experiência e a sabedoria, acumuladas por décadas, trazem uma visão única e indispensável.
Nossa medicina precisa redescobrir os cinco sentidos e o valor de ouvir. É hora de buscar o equilíbrio entre o que a tecnologia nos oferece e o que a humanização da prática ainda pode e deve proporcionar. Que possamos aprender com a sabedoria dos médicos de outras gerações, para que a medicina retorne a um lugar onde o paciente é mais do que um número ou um exame, mas um ser humano que precisa ser compreendido em sua complexidade.