Viver depois que um filho parte é caminhar sobre um campo minado de memórias. É carregar no peito um pedaço de vidro, afiado e eterno, que corta a cada movimento, a cada lembrança.
Numa carta escrita com a alma, uma mãe fala a Lucas, o filhote amado que partiu quase seis anos atrás. Ela evoca Roma — a cidade eterna —, onde sonhou um dia caminhar com ele, redescobrindo becos e praças carregados de história e de amor. Sonhos que não se realizaram, sonhos roubados pelo destino que não se explica.
Hoje, ela fala para ele como quem escreve para as estrelas. Como quem acredita que o amor pode atravessar os véus entre os mundos. O amor que pulsa não conhece a palavra “fim”. Em cada frase, ecoa o que José Carlos Capinam escreveu: “Foi o teres passado na tua forma mais pura no meu espelho quebrado.”
O espelho que se quebrou não perdeu o reflexo. Cada caco carrega a imagem inteira, mesmo que em fragmentos. Cada palavra dessa mãe é uma oferenda de amor e de saudade, um fio de prata costurando o abismo da ausência.
Chico Buarque sussurra na memória: “Oh! pedaço de mim, oh! metade arrancada de mim…”. Mas é na dor dessa metade que floresce uma nova inteireza: a mãe que aprende a viver sem esquecer, a sorrir sem deixar de chorar, a amar sem limites nem fronteiras.
Enquanto houver amor, haverá espelhos — mesmo que quebrados.