O episódio envolvendo o pastor Silas Malafaia, que sofreu uma tentativa de assalto no Rio de Janeiro, reacende debates importantes sobre a segurança pública, o uso de policiais como seguranças privadas e as lacunas na estrutura estatal. Embora a rápida ocorrência das seguranças tenha impedido um desenvolvimento trágico, uma questão central não pode ser ignorada: a prática de policiais militares realizando “bicos” como seguranças.
A Polícia Militar do Rio de Janeiro, ao anunciar a abertura de uma investigação pela Corregedoria, demonstra preocupação com a possível violação de regras internas. De fato, a legislação proíbe que policiais atuem em atividades privadas enquanto estiverem vinculados ao serviço público. A justificativa é simples: policiais são agentes do Estado, remunerados para garantir a segurança coletiva e não para proteger interesses individuais, ainda que legítimos.
A precariedade que alimenta o “bico”
Porém, não podemos abordar o tema sem considerar as causas subjacentes. As baixas dificuldades, a falta de infraestrutura e o risco constante que esses profissionais estão sujeitos tornam o “bico” uma alternativa atraente – e, para muitos, necessária – para complementar a renda. É um problema sistêmico, enraizado na ausência de políticas que valorizam especificamente os profissionais de segurança pública.
Quando líderes religiosos, políticos ou empresários recorrem a policiais como seguranças privadas, eles não apenas tiram esses agentes das ruas, mas também perpetuam a desigualdade na prestação do serviço público. Afinal, a proteção individual de uma figura pública não deveria ser realizada à custa da segurança de uma população vulnerável, que continua enfrentando o aumento da violência urbana.
A responsabilidade das lideranças
O caso também lança luz sobre a responsabilidade de líderes influentes, como Silas Malafaia. Ainda que ele não tenha, até o momento, confirmado ou negado a contratação de policiais, é ético que figuras públicas evitem práticas que possam fragilizar ainda mais as instituições de segurança. A segurança de todos deve ser garantida pelo Estado e não terceirizada a partir de privilégios.
O incidente, registrado em vídeo e amplamente divulgado, reforça outra questão: a violência urbana no Rio de Janeiro. A presença de bandidos armados, a audácia dos assaltos em plena luz do dia e o constante clima de insegurança são sintomas de uma cidade que há anos convive com o crime organizado e a ineficiência das políticas públicas para combatê-lo.
Reflexão e mudança
O episódio vai além de Malafaia e dos policiais que possivelmente atuavam como suas seguranças. Trata-se de uma oportunidade para questionar o modelo de segurança pública, que muitas vezes abandona seus agentes à própria sorte, e refletir sobre as práticas éticas de figuras públicas que se beneficiam das fragilidades do sistema.
O Estado brasileiro precisa oferecer condições dignas de trabalho e remuneração para que seus policiais possam se dedicar integralmente ao serviço público. Só assim será possível superar o dilema moral e prático do “bico”, garantindo que a segurança de uma população inteira não seja sacrificada em nome de interesses privados.
O pastor Silas Malafaia sobreviveu ao assalto, mas a sociedade brasileira continua refém de um sistema que insiste em remediar em vez de prevenir. É hora de mudar.