(Padre Carlos)
A imagem que estampou a capa do jornal “Equipe” em novembro de 1980 oferece uma janela para um momento de celebrações e profunda transformação em Vitória da Conquista. A cidade completou 140 anos de emancipação política e, em meio a essa efervescência de orgulho e identidade, nascia o que viria a se tornar um dos maiores símbolos locais: o Cristo de Vitória da Conquista, criação do renomado escultor Mário Cravo Júnior.
Essa obra monumental, erguida no alto da Serra do Periperi, foi mais do que uma homenagem à fé do povo conquistense. Cravo Júnior, com seu estilo único e sua percepção sensível, imprimiu ao Cristo uma representação que transcende o caráter religioso para alcançar um patamar artístico e histórico que define a própria identidade da cidade. A escolha desse artista, um dos maiores expoentes da arte brasileira, evidencia a visão ousada dos líderes da época, que consideraram na arte uma poderosa ferramenta de identidade e progresso.
O Cristo de Vitória da Conquista é um marco visível de diferentes pontos da cidade, transformando-se em um farol que guia o olhar e o espírito da comunidade. É um destino para peregrinos e visitantes, e um ponto de referência para moradores, reafirmando diariamente os laços entre o homem e o divino. Contudo, sua importância ultrapassa os contornos da devoção. A figura do Cristo projetada em meio ao horizonte conquistense torna-se um testemunho da fé e da resiliência de um povo que, no alto de seus desafios, sempre buscou forças para seguir adiante.
A construção do Cristo de Vitória da Conquista se deu em um contexto histórico complexo e cheio de nuances. Em plena ditadura militar, quando o Brasil buscava traçar e afirmar uma identidade nacional, o monumento representa, em parte, a resistência cultural de uma cidade do interior. Em um período marcado por um regime que impunha silêncios, a escolha de erigir uma obra de arte pública com tamanha imponência revela a necessidade de expressão, ainda que silenciosamente, um sentimento de pertença, união e afirmação da cultura local.
Com o tempo, o Cristo deixou de ser um simples marco no território físico e passou a habitar o imaginário coletivo. Ele é evocado em manifestações artísticas, eventos, campanhas, e até na memória afetiva de uma cidade que cresceu à sua sombra. Mais do que uma estátua, tornou-se uma síntese da identidade conquistense, unindo a história, a cultura e a espiritualidade de seu povo.
Ao contemplar essa obra de Mário Cravo Júnior, não estamos apenas admirando uma peça artística; estamos revisitando a própria história de Vitória da Conquista e questionando nosso papel na construção do presente e do futuro da cidade. O Cristo de Vitória da Conquista é, portanto, um monumento que, ao mesmo tempo, reflete e amplia o que somos. É o testemunho eterno da fé, da esperança e da força de uma cidade que, ao longo dos anos, continua a se reinventar, mantendo viva sua alma.