Hoje, completam-se sete anos desde o súbito falecimento de Dom Celso, na madrugada de 28 de setembro de 2018. Vítima de uma parada cardíaca, ele nos deixou de maneira inesperada, deixando um vazio profundo em seu clero, nos fiéis e, sem dúvida, em mim. Sinto que, apesar do tempo, sua presença continua viva em minha memória e em meu coração. Shakespeare, mestre das paixões humanas, uma vez escreveu que “quando alguém morre, a sua bondade é também enterrada com ele.” Mas a bondade de Dom Celso, como pastor, pai e amigo, é imensa demais para que a morte a apague. Sua ausência física pode ser real, mas sua bondade, seu legado e sua espiritualidade permanecem vivos entre nós.
A morte de Dom Celso me faz lembrar de como, quando um pai espiritual parte, uma parte de nós morre também. O poeta inglês John Donne, em seu famoso sermão, afirmou que “a morte de qualquer homem me diminui, pois faço parte da humanidade.” E é assim que me sinto. A perda de Dom Celso não foi apenas uma perda pessoal, mas uma diminuição de nossa comunidade, de nossa Igreja, de nossa fé coletiva.
No entanto, aproveito este momento para contar a história de como conheci Dom Celso e, com isso, me apaixonei pela Diocese de Vitória da Conquista. A vida é feita de encontros e desencontros, planejados ou frutos do acaso, mas são esses encontros que moldam quem somos e definem o rumo de nossas vidas. Como diz o poeta Vinícius de Moraes, “A vida é a arte do encontro, embora haja tanto desencontro pela vida.”
No início dos anos 90, eu vivia com os irmãos de Taizé, uma comunidade monástica ecumênica que me influenciou profundamente. Durante aquele ano de convivência, fui orientado espiritualmente pela irmã Rafaela, uma religiosa com uma espiritualidade profundamente marcada pelos ensinamentos de Santo Inácio de Loyola. Foi através dela que recebi um convite para ingressar na Diocese de Paulo Afonso, recomendado por Dom Mário. Naquele momento, parecia que meu futuro estava decidido. Eu estava pronto para seguir aquele caminho.
Porém, como a vida gosta de nos surpreender, irmã Rafaela sugeriu que eu conhecesse um bispo de uma outra diocese: Dom Celso José, que estava hospedado em Salvador naquele momento. Relutante, já que achava que minha decisão havia sido tomada, fui por respeito à minha orientadora. E foi ali, no encontro com Dom Celso, que minha vida mudou.
Ao ser apresentado a ele, não conheci apenas um homem de fé, mas uma Igreja verdadeiramente misericordiosa. Uma Igreja que acolhia, que perdoava, que animava os seus fiéis sem fazer distinções. A bondade e o amor que Dom Celso transmitia eram evidentes desde o primeiro encontro. Ele era mais que um bispo, era um verdadeiro pai espiritual, alguém cuja bondade parecia refletir o próprio amor de Deus. Ao longo dos anos que tive o privilégio de conviver com ele, fui abençoado pela graça que ele irradiava – uma graça que não exigia perfeição, mas sim um coração aberto à misericórdia.
Dom Celso tinha um amor especial por seus presbíteros. Ele se preocupava com cada um de nós, independentemente de merecermos ou não, de estarmos à altura de suas expectativas ou não. Era comovente sua constante dedicação ao nosso bem-estar, sua preocupação com a nossa formação acadêmica e espiritual. Ele entendia que um clero bem formado era essencial para a missão da Igreja, e esse foi um dos seus maiores legados.
Com o passar dos anos, tenho visto uma geração de bispos, como Dom Celso, partir para o braço do Pai. Muitos desses pastores vieram da Ação Católica, um movimento que formou grandes intelectuais e líderes da Igreja. A preocupação de Dom Celso com a formação do clero, dos leigos e dos movimentos eclesiais reflete essa espiritualidade, que enxerga na educação e no conhecimento um caminho para fortalecer a fé e criar uma verdadeira comunidade cristã.
Hoje, quando olho para trás, só posso agradecer a Deus e àquela freira que insistiu para que eu conhecesse a Diocese de Vitória da Conquista e, sobretudo, Dom Celso. Ele não apenas mudou o rumo de minha vida, mas também me mostrou o que é ser um verdadeiro pastor. Se, por algum motivo, não tive a oportunidade ou a coragem de dizer isso em vida, digo agora, antes que seja tarde demais: Obrigado, Dom Celso, por ter me acolhido, protegido e, acima de tudo, acreditado em mim.
A sua bondade não foi enterrada com o seu corpo. Ela vive em cada um de nós que tivemos a honra de ser guiados por você. Que possamos continuar caminhando sob a sua inspiração, servindo com o mesmo amor, a mesma misericórdia e a mesma graça que você nos ensinou.
Padre Carlos