Os números são estarrecedores: R$ 6,3 bilhões desviados de quem menos pode perder. Enquanto escrevo este artigo, milhões de aposentados e pensionistas descobrem que foram vítimas não apenas de um golpe financeiro, mas de uma traição institucional sem precedentes. A Operação Sem Desconto, deflagrada nesta semana, expõe as entranhas de um sistema que falhou precisamente com aqueles que mais dependem dele: nossos idosos e pessoas vulneráveis.
O que testemunhamos não é um simples desvio administrativo ou uma falha pontual. Estamos diante de um esquema organizado e persistente que operou por cinco anos, sugando recursos de 37 milhões de beneficiários do INSS. Com a conivência de servidores, a participação ativa de entidades sindicais e a omissão de autoridades que deveriam proteger o interesse público, criou-se uma verdadeira indústria da pilhagem previdenciária.
O afastamento do presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, apenas evidencia a gravidade do caso. Mas não nos enganemos: os verdadeiros prejudicados não são as autoridades temporariamente removidas de seus cargos, e sim os milhões de brasileiros que viram suas já minguadas aposentadorias serem dilapidadas sem seu conhecimento ou consentimento.
É revoltante pensar que enquanto famílias cortavam despesas essenciais para sobreviver com um benefício cada vez mais corroído pela inflação, havia todo um sistema operando para subtrair ainda mais desses recursos. Servidores que deveriam servir tornaram-se predadores. Sindicatos que deveriam defender transformaram-se em parasitas. O Estado que deveria proteger atuou como cúmplice.
Não há como minimizar este escândalo. O Brasil presencia uma das maiores violações de confiança pública já registradas. Cada real desviado representa uma refeição a menos na mesa de um idoso, um remédio que deixou de ser comprado, uma necessidade básica não atendida. Por trás dos números bilionários, há rostos, histórias e sofrimento real.
A justiça precisa ser exemplar. Não bastam afastamentos temporários e devoluções parciais. Os responsáveis – sejam servidores corruptos, sindicalistas inescrupulosos ou gestores negligentes – devem enfrentar todo o rigor da lei. A devolução integral dos valores é apenas o começo. A punição deve ser proporcional não apenas ao valor desviado, mas ao impacto humano causado por essa fraude sistêmica.
Mais do que uma investigação criminal, o caso demanda uma profunda reflexão sobre nossos mecanismos de proteção social. Como permitimos que justamente os mais vulneráveis se tornassem presas fáceis de um esquema tão descarado? Que falhas de governança possibilitaram que R$ 6,3 bilhões fossem desviados sem que os alertas soassem? O que isso diz sobre nossas instituições e sua capacidade de cumprir sua missão mais elementar?
Enquanto os mandados de busca e apreensão são cumpridos e os primeiros responsáveis são conduzidos à Justiça, precisamos exigir muito mais do que investigações. Precisamos de uma reformulação completa dos sistemas de controle e transparência do INSS. Precisamos de garantias reais de que cada centavo dos benefícios chegará integralmente a seus destinatários legítimos.
A Operação Sem Desconto revela muito mais que um esquema de corrupção – expõe a fragilidade de um país que não consegue proteger aqueles que contribuíram uma vida inteira para construí-lo. É hora de transformar a indignação em ação consequente, exigindo não apenas justiça para os culpados, mas um sistema previdenciário que honre seu compromisso com os brasileiros. Nossos aposentados merecem mais do que desconto – merecem respeito, dignidade e a garantia de que seu suor e trabalho não serão traídos novamente.
Padre Carlos