Política e Resenha

O Silêncio que Habita a Xícara

 

 

Na cozinha, sobre o tampo de madeira gasta pelo tempo e pelas mãos que ali se moviam, uma xícara repousa. Não sabe ela — e como saberia? — que o café esfriou. O vapor que antes dançava em espirais desejosas já foi embora, roubado por aquele ladrão sorrateiro que é o tempo. Grãos de açúcar, pequenos flocos de doçura incompleta, jazem no fundo da xícara, inertes, como sonhos adormecidos.

O relógio na parede segue seu ritmo obstinado, soprando horas que caem como folhas secas. E eu, sentada aqui, escuto o silêncio crescer. Ele não grita, mas ecoa mais alto que qualquer palavra dita ou calada. Entre essas palavras perdidas está a história dele, dos chinelos encostados à porta, ainda moldados pelos pés que um dia os usaram. Como podem objetos tão simples serem mais eloquentes que um adeus? Talvez porque o adeus seja apenas uma palavra, enquanto os chinelos guardam o peso de quem partiu.

A luz da tarde entra pela janela, morna e indiferente, caindo sobre o sofá vazio. Ali, onde dois corpos costumavam traçar mapas invisíveis com seus toques, agora só resta o tecido esticado, marcado por uma ausência que insisto em tocar. Meus dedos procuram relevo onde não há mais nada além de memória. Até quando a ausência será mais presente que o próprio amor? Essa pergunta paira no ar, leve como poeira ao vento, mas pesada como pedra no peito.

No jardim, as flores murcham sem cerimônia, entregues à inevitabilidade da vida que se vai. Não há beleza nisso, nem poesia. Apenas o cheiro agridoce da terra molhada e o vento que leva as pétalas, uma a uma, como cartas escritas às pressas e nunca enviadas. Eu gostaria de recolhê-las, arrumá-las em envelopes cuidadosamente selados, mas para qual endereço? Para quem escreveríamos essas linhas que o coração ainda tenta enviar?

Às vezes, abro a gaveta da cômoda e encontro o lenço que ele usava. Está ali, dobrado com cuidado, como se ainda pudesse limpar lágrimas ou segredos. O perfume que exala é tênue, quase imperceptível. Lavanda? Saudade? Ou talvez seja apenas o engano dos sentidos, que insistem em conjurar fantasmas onde antes havia carne e risos.

Pergunto-me: o amor, quando parte, deixa rastros ou apenas buracos? Será que a falta é um monumento erguido à memória, ou simplesmente o pó acumulado nos cantos da casa, esperando ser varrido? Penso nisso enquanto olho para a mesa da cozinha, onde a xícara continua vazia, imóvel, como se aguardasse algo que nunca mais virá.

E você, leitor? O que guarda no fundo da sua gaveta? O que faz quando a ausência bate à porta e se senta à mesa, como quem nunca foi embora? O relógio continua soprando suas horas intermináveis, e a xícara, paciente, espera. Por quê? Talvez porque, mesmo no vazio, ainda haja espaço para esperança. Ou talvez porque o vazio, afinal, seja tudo o que nos resta.

Padre Carlos