A recente ovada no governador da Bahia, Jerônimo Rodrigues, em uma carreata em Jeremoabo, é mais do que uma manifestação de descontentamento isolada – é o prenúncio de uma crise que há muito vem se desenhando no Partido dos Trabalhadores (PT). Essa crise não é apenas política, mas profundamente existencial. O PT, um partido forjado nas lutas populares e movido por uma ideologia de esquerda clara e militante, agora parece perder-se em alianças de conveniência, traindo a base que lhe deu origem e sustentação.
O episódio em Jeremoabo, onde petistas revoltados jogaram ovos no governador em protesto pelo seu apoio a um candidato do Partido Progressistas (PP), é simbólico. O PT, que em décadas passadas marchou de braços dados com movimentos sociais, sindicatos e a classe trabalhadora, agora se vê fazendo alianças com forças que, historicamente, estiveram em campos opostos. O apoio de Jerônimo a Mateus de Deri, do PP, em detrimento do candidato petista Fabio da Farmácia, escancarou essa ferida, levando militantes a expressarem sua insatisfação de forma, no mínimo, inusitada.
Pragmatismo Eleitoral ou Traição Ideológica?
A justificativa oficial para tais alianças geralmente gira em torno do pragmatismo eleitoral. Em uma democracia de coalizões, dizem, é preciso construir pontes para garantir a governabilidade. Entretanto, há uma linha tênue entre o pragmatismo necessário e a traição aos princípios fundadores de um partido. O PT, que sempre se orgulhou de sua coerência ideológica e histórica, parece agora disposto a negociar esses princípios em troca de ganhos eleitorais pontuais.
A situação em Jeremoabo é um reflexo claro desse dilema. Em vez de manter a coerência ideológica e apoiar seu próprio candidato, Jerônimo optou por um acordo com o PP, um partido que representa forças políticas e econômicas que tradicionalmente se chocaram com os valores petistas. O resultado? Uma base militante desiludida e revoltada, que não hesitou em demonstrar seu descontentamento de maneira agressiva.
Uma Crise Sem Precedentes
O que aconteceu em Jeremoabo é mais do que um incidente local. Trata-se de um sintoma de uma crise maior que pode levar o PT a enfrentar o que muitos chamam de “crise sem presidente”. O partido que, por tanto tempo, centralizou sua identidade na figura de líderes carismáticos e em uma agenda política progressista, pode agora ver-se sem uma liderança unificadora, sem uma agenda clara, e – o mais preocupante – sem o apoio de sua base mais fiel.
O PT não é mais o partido de uma militância aguerrida e engajada. Hoje, muitos dos seus movimentos parecem ser ditados por cálculos eleitorais frios, em busca de uma densidade eleitoral que, na prática, pode ser uma ilusão. O apoio a candidatos de partidos como o PP, que têm bases eleitorais fortes em determinadas regiões, parece ser uma estratégia que visa garantir vitórias locais a qualquer custo, mas que pode custar muito caro no longo prazo.
O Futuro do PT: Restauração ou Fragmentação?
O PT está em uma encruzilhada. Continuar pelo caminho do pragmatismo sem princípios pode levar o partido a perder sua identidade, fragmentar-se em facções e afastar ainda mais sua base militante. A militância, que outrora era o coração pulsante do partido, parece agora cada vez mais distante, desiludida e, como vimos em Jeremoabo, revoltada.
Por outro lado, o partido ainda tem a chance de se restaurar, reconectar-se com suas raízes e retomar uma agenda política coerente com seus princípios fundadores. Isso exige coragem para recusar alianças oportunistas e disposição para reconquistar a confiança da base. Mas, para isso, o PT precisa de liderança – uma liderança que, ao que parece, está cada vez mais ausente.
O caso de Jeremoabo deve servir de alerta para a cúpula do partido. Não é apenas uma questão de votos ou de apoio regional. O que está em jogo é o futuro do PT como uma força política relevante e coerente no Brasil. Se o partido não se reconectar com sua base, suas alianças pragmáticas podem se transformar em seu próprio veneno, levando-o a uma crise sem precedentes, possivelmente culminando em uma ruptura interna que colocaria em xeque sua existência tal como a conhecemos.
Conclusão
A política é, por natureza, uma arena de negociações, mas também de princípios. O PT parece estar sacrificando um em nome do outro, e o resultado disso pode ser desastroso. A ovada contra Jerônimo Rodrigues não foi apenas um ato de insatisfação local; foi um grito de alerta. O partido que não ouve sua base, que não mantém sua identidade e que perde seus princípios, está destinado a perder não apenas eleições, mas também sua própria alma. Se o PT continuar trilhando esse caminho, poderá, em breve, encontrar-se sem um presidente e, pior, sem um partido que se reconheça como tal.