As apostas esportivas online, hoje uma febre no Brasil, prometeram ganhos rápidos e acessíveis, mas trouxeram consigo um problema grave e crescente: o vício no jogo. Alimentadas por campanhas de marketing massivo e por plataformas que se multiplicam a cada dia, essas apostas têm atraído milhares de brasileiros, muitos deles em situação de vulnerabilidade financeira, a se lançarem num ciclo de endividamento perigoso. Precisamos, com urgência, de uma resposta assertiva para lidar com essa situação.
De acordo com dados recentes do Banco Central, apenas em agosto de 2024, cerca de cinco milhões de beneficiários do Bolsa Família destinaram aproximadamente R$ 3 bilhões a plataformas de apostas. Um valor chocante, que aponta para um problema social grave: famílias inteiras estão comprometendo parte de sua renda, já limitada, em apostas que, na maioria das vezes, não trazem o retorno prometido. Esse fenômeno coloca em xeque a capacidade do Estado de proteger seus cidadãos dos riscos de um mercado que opera, até o momento, com pouquíssimas amarras regulatórias.
A publicidade agressiva e a facilidade de acesso a essas plataformas transformam o ato de apostar em um hábito banalizado, acessível a qualquer um que tenha um celular e conexão com a internet. Contudo, a ausência de restrições específicas sobre o crédito para apostas e a ausência de limites claros de gasto tornam essa prática uma armadilha. Essa realidade nos faz questionar até que ponto é moralmente aceitável que um setor, cujo lucro vem do dinheiro perdido por milhares de brasileiros, siga sem enfrentar limites claros.
Experiências de países como o Reino Unido e a França já demonstram que, com regulamentações robustas, é possível mitigar os danos sociais e financeiros das apostas. Em muitos desses países, o consumidor pode solicitar a autoexclusão temporária das plataformas, estabelecendo limites financeiros e de tempo para apostar, além de contarem com campanhas educativas constantes sobre os riscos do vício. São ações simples, mas de um impacto profundo na proteção das pessoas mais vulneráveis ao vício. Seguir esses exemplos é urgente e sensato para o Brasil, se quisermos proteger nossa população da devastação financeira e emocional que o vício em apostas pode causar.
A proposta de regulamentação que tramita atualmente na Câmara dos Deputados é um avanço nesse sentido. É preciso, porém, que o Congresso Nacional avance não apenas no estabelecimento de um marco regulatório para o setor de apostas online, mas também em garantir que esse marco seja voltado prioritariamente para a proteção do consumidor. As empresas de apostas, por sua vez, devem ser chamadas a assumir responsabilidades, sendo obrigadas a praticar um marketing ético, sem iludir o público com promessas de enriquecimento fácil.
O bem-estar do cidadão brasileiro deve ser prioridade em qualquer decisão política. Que o Congresso Nacional trate esse tema com a seriedade que merece, sendo sensível às necessidades dos milhões de brasileiros que, em busca de alívio financeiro, encontram-se hoje presos na armadilha do endividamento causado por apostas. O papel do Estado é proteger, regular e, sobretudo, agir preventivamente para que a ilusão do lucro fácil não se torne uma armadilha financeira. O entretenimento deve existir, mas não às custas da segurança e da estabilidade das famílias brasileiras.
Que avancemos nessa regulamentação com a coragem necessária, lembrando que o verdadeiro progresso é aquele que não sacrifica a dignidade humana.