Política e Resenha

Quem é Ateu e Viu Milagres como Eu: A Reflexão de Caetano Veloso

 

 

 

 

Caro leitor, hoje me aventuro a explorar o fascinante e complexo tema dos “Milagres do Povo”, imortalizado pela poesia de Caetano Veloso e inspirado pelo grande mestre da literatura, Jorge Amado. Esse conceito nos convida a refletir profundamente sobre a interação entre fé, razão e a capacidade extraordinária do ser humano de encontrar sentido e maravilha onde, à primeira vista, a lógica parece falhar.

Na música “Milagres do Povo”, Caetano Veloso nos brinda com uma frase de aparente contradição: “Quem é ateu e viu milagres como eu…”. Esta afirmação, à primeira vista paradoxal, provoca a mente e instiga a reflexão. Afinal, como pode um ateu, alguém que nega a existência de Deus ou de divindades, testemunhar milagres? Não estaria o conceito de milagre reservado apenas àqueles que creem no poder divino? No entanto, é justamente nessa aparente contradição que reside a beleza dessa reflexão. Caetano nos convida a mergulhar nas complexidades da experiência humana, onde razão e fé se entrelaçam de maneiras imprevisíveis.

Os milagres, como nos sugere a canção, não pertencem exclusivamente ao domínio da religião ou da fé em um ser supremo. Eles podem emergir em qualquer parte, nas menores e mais sutis maravilhas da vida cotidiana. O nascimento de uma criança, o desabrochar de uma flor, uma cura inesperada, a solidariedade em tempos de crise — todos são exemplos de milagres que transcendem a crença religiosa e que podem ser admirados por qualquer pessoa, independente de sua posição espiritual.

A frase de Caetano nos remete a uma visão de mundo onde os milagres do povo são aqueles eventos extraordinários que, embora inexplicáveis pela razão, não deixam de ser profundamente reais e transformadores. A cultura popular brasileira, com sua rica tapeçaria de narrativas e tradições, é pródiga em relatos que ilustram esses “milagres”. São histórias que atravessam gerações, falam de fé, esperança, coragem e, acima de tudo, da inquebrantável capacidade humana de sobreviver e se adaptar ao mistério da existência.

Em uma sociedade cada vez mais cética e guiada pela razão científica, há uma necessidade urgente de redescobrir a capacidade de se maravilhar com a vida. As explicações racionais são cruciais para nossa compreensão do mundo, mas elas não esgotam o mistério que envolve a experiência humana. Existem aspectos da vida que escapam ao alcance da ciência e da lógica pura, e é aqui que o conceito de “milagres do povo” ganha vida. Não é necessário ser religioso para perceber que há algo de inexplicável e grandioso em certas experiências humanas.

A reflexão de Caetano nos convida a ampliar nossos horizontes. Ele nos desafia a procurar o extraordinário no cotidiano, a ver a vida com um olhar mais atento, a encontrar beleza e mistério nas coisas mais simples. A busca pelos milagres do povo não se restringe a uma jornada espiritual; ela é também uma jornada interior, uma busca pela plenitude humana que envolve tanto a mente quanto o coração.

Nesse sentido, o “milagre” pode ser visto como algo que nos desperta para a profundidade da vida. É aquela experiência que nos tira do lugar comum, que nos faz perceber que a realidade não pode ser totalmente encapsulada pelas categorias da lógica ou do empirismo. Os milagres que Caetano descreve são, talvez, menos sobre intervenções divinas e mais sobre um estado de abertura ao inexplicável, ao inusitado, ao surpreendente.

É importante ressaltar que essa visão de mundo não exclui a razão, mas a complementa. O coração e a mente podem coexistir em harmonia, assim como a fé e o ceticismo podem, paradoxalmente, se entrelaçar na busca pelo sentido. É nesse espaço de ambiguidade que o “milagre” acontece: na intersecção entre o racional e o irracional, entre o visível e o invisível, entre o palpável e o transcendente.

Portanto, caro leitor, convido você a se juntar a essa busca pelos “Milagres do Povo”. Eles estão à nossa volta, mais próximos do que imaginamos, esperando para serem reconhecidos e apreciados. Em tempos em que o avanço científico e tecnológico parece muitas vezes distanciar o homem do mistério da vida, é vital que mantenhamos viva a capacidade de nos maravilhar com a magia e a complexidade da existência humana.

E, quem sabe, ao final dessa jornada, possamos, como Caetano, chegar à conclusão de que até mesmo aqueles que se consideram ateus podem testemunhar milagres. Pois, no fundo, o que importa não é tanto o sistema de crenças que adotamos, mas a abertura que temos para o mistério e a maravilha de estar vivo. A fé, como Caetano sugere, é apenas uma das muitas maneiras de abraçar o milagre que é viver.

Artigo por Padre Carlos