Por Padre Carlos
A etimologia do termo “sínodo”, derivado do grego synodos (σύν + ὁδός), evoca uma bela imagem: caminhar juntos. Essa ideia traduz um princípio profundo de comunhão, participação e corresponsabilidade, conceitos que deveriam ser o coração pulsante da vida eclesial. No entanto, quando confrontamos essa nobre visão com algumas realidades concretas da Igreja, um desconforto inevitável surge.
A sinodalidade tem sido promovida com vigor no pontificado do Papa Francisco, especialmente como parte de sua busca por uma Igreja mais inclusiva e dialogal, fiel ao espírito do Concílio Vaticano II. Todavia, a prática revela que ainda estamos engatinhando. Dois temas centrais ilustram essa dificuldade: o papel dos padres casados e a ordenação de mulheres, mesmo em graus menores, como o diaconato. Ambos permanecem praticamente intocados nas discussões oficiais, mesmo quando deveriam estar no centro das reflexões sinodais.
O paradoxo da exclusão em uma Igreja que caminha junto
O tema da ordenação de mulheres é um exemplo evidente de onde o “caminhar juntos” tropeça. Não estamos sequer próximos de discutir plenamente a ordenação diaconal, um passo que, em tese, seria mais viável e abriria caminho para uma maior participação das mulheres no ministério ordenado. Como reconciliar o discurso da inclusão com práticas que perpetuam a exclusão de metade da humanidade?
A questão dos padres casados, por sua vez, é igualmente emblemática. Apesar de ser amplamente aceito que o celibato é uma disciplina, e não um dogma, a Igreja mantém-se rígida, exceto em casos especiais, como no rito oriental. Ouvem-se argumentos que associam o celibato à disponibilidade plena ao Reino, mas o contexto atual, marcado pela crise de vocações e pela sede de proximidade pastoral, pede novas abordagens.
Sinodalidade: de palavra a prática
Se a sinodalidade deve ser vivida, ela precisa transcender a teoria e se traduzir em escuta real e ações concretas. De pouco adianta popularizar o termo se, ao final, ele não modifica estruturas ou práticas. Isso é especialmente desafiador em uma Igreja que, muitas vezes, parece temer o novo e o debate franco, preferindo o conforto de tradições cristalizadas.
É aqui que o Papa Francisco nos oferece esperança. Sua insistência na escuta e na abertura aponta para um caminho transformador. No entanto, o próprio sínodo sobre a sinodalidade, por mais inovador que seja em metodologia, parece ter esbarrado em resistências internas. Os frutos concretos ainda são modestos diante das expectativas.
O que está em jogo
A sinodalidade não é apenas uma questão de governança eclesial. Ela toca na essência da missão da Igreja no mundo contemporâneo. Uma Igreja que caminha verdadeiramente junta é aquela que valoriza a diversidade de vocações e ministérios, que reconhece que as mudanças culturais e sociais demandam respostas corajosas e criativas.
O desafio é enorme, mas a necessidade é maior ainda. Como podemos ser uma Igreja sinodal se partes essenciais da nossa comunidade se sentem ignoradas ou silenciadas? Não há sinodalidade autêntica sem a inclusão de todos na caminhada, especialmente daqueles que, ao longo da história, foram deixados às margens.
Conclusão: a urgência de avançar
Se a sinodalidade deve ser mais que um conceito bonito, a Igreja precisa demonstrar que está disposta a questionar-se e a renovar-se. Isso inclui abordar, sem medo, temas como o celibato clerical e a ordenação de mulheres. Permanecer inerte nessas questões é contradizer o próprio espírito sinodal, que pede comunhão, participação e missão compartilhada.
Que o “caminhar juntos” não seja apenas um slogan, mas uma realidade transformadora. Pois, no fim das contas, o que está em jogo é a credibilidade da Igreja como espaço de acolhimento, escuta e comunhão para todos os filhos e filhas de Deus.