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Na metade decisiva de um mandato presidencial, o Brasil se encontra numa encruzilhada hist\u00f3rica. Passados dois anos de governo Lula em seu terceiro mandato, chegamos ao ponto crucial em que as promessas precisam finalmente se materializar em a\u00e7\u00f5es concretas. Este segundo bi\u00eanio representa, portanto, n\u00e3o apenas mais um per\u00edodo administrativo, mas uma janela de oportunidade que, se desperdi\u00e7ada, poder\u00e1 comprometer o legado de um dos l\u00edderes mais emblem\u00e1ticos da hist\u00f3ria pol\u00edtica brasileira.<\/p>\n
A matem\u00e1tica do tempo pol\u00edtico \u00e9 implac\u00e1vel. Quando um governante chega \u00e0 metade de seu mandato, a ampulheta come\u00e7a a esvaziar-se com velocidade assustadora. O primeiro ano \u00e9 normalmente dedicado \u00e0 organiza\u00e7\u00e3o da casa, \u00e0 montagem de equipes e ao desenho de programas. O segundo \u00e9 quando as engrenagens come\u00e7am a girar. Por\u00e9m, o quarto ano j\u00e1 \u00e9 consumido pela sucess\u00e3o eleitoral, quando as aten\u00e7\u00f5es se voltam para o futuro pleito e a capacidade de implementa\u00e7\u00e3o de pol\u00edticas estruturantes diminui consideravelmente. Resta, portanto, o terceiro ano \u2013 exatamente onde estamos \u2013 como o momento decisivo para a concretiza\u00e7\u00e3o de mudan\u00e7as profundas.<\/p>\n
N\u00e3o se trata aqui de negar a import\u00e2ncia da responsabilidade fiscal ou da estabilidade macroecon\u00f4mica. Trata-se, sim, de questionar a quem servem essas pol\u00edticas e qual filosofia as orienta. O equil\u00edbrio das contas p\u00fablicas n\u00e3o pode ser um fim em si mesmo, mas um meio para garantir a capacidade do Estado de promover transforma\u00e7\u00f5es sociais duradouras. Quando o ajuste recai persistentemente sobre os ombros dos mais vulner\u00e1veis e da classe m\u00e9dia, enquanto setores privilegiados permanecem intocados, n\u00e3o estamos diante de uma pol\u00edtica econ\u00f4mica tecnicamente inevit\u00e1vel, mas de uma escolha pol\u00edtica que reproduz desigualdades hist\u00f3ricas.<\/p>\n
O Brasil elegeu Lula n\u00e3o por sua capacidade administrativa ou por seu dom\u00ednio t\u00e9cnico sobre planilhas or\u00e7ament\u00e1rias. O Brasil elegeu o l\u00edder que, nascido na pobreza, compreendia visceralmente o significado da exclus\u00e3o social e transformava essa compreens\u00e3o em combust\u00edvel para mudan\u00e7as estruturais. O pa\u00eds votou no presidente que conseguia traduzir n\u00fameros frios em hist\u00f3rias humanas, que enxergava para al\u00e9m dos indicadores econ\u00f4micos e compreendia que desenvolvimento real significa melhorar concretamente a vida das pessoas.<\/p>\n
Esta \u00e9 precisamente a ess\u00eancia que parece ter se dilu\u00eddo nos meandros da governan\u00e7a di\u00e1ria. O Lula que agora precisa ressurgir n\u00e3o \u00e9 o administrador cauteloso, mas o articulador audacioso de um projeto nacional de desenvolvimento inclusivo. O Brasil necessita do presidente que n\u00e3o teme confrontar privil\u00e9gios arraigados e que tem a coragem de reorientar prioridades, mesmo quando isso significa enfrentar resist\u00eancias poderosas.<\/p>\n
Neste contexto, a influ\u00eancia baiana no governo \u2013 representada por figuras como Rui Costa na Casa Civil, Jaques Wagner no Senado e o emergente Sid\u00f4nio \u2013 n\u00e3o \u00e9 mero detalhe regional, mas potencial catalisador de uma gest\u00e3o mais ousada e conectada com as necessidades populares. A tradi\u00e7\u00e3o pol\u00edtica baiana, com sua capacidade de combinar pragmatismo administrativo e sensibilidade social, pode oferecer ao governo federal um caminho para reconciliar responsabilidade econ\u00f4mica com transforma\u00e7\u00e3o social.<\/p>\n
Estamos, portanto, diante de um momento decisivo. Os pr\u00f3ximos meses determinar\u00e3o se este governo entrar\u00e1 para a hist\u00f3ria como mais uma administra\u00e7\u00e3o que sucumbiu ao pragmatismo conservador ou se recuperar\u00e1 o \u00edmpeto transformador que caracterizou os melhores momentos da trajet\u00f3ria de Lula. A escolha n\u00e3o \u00e9 entre responsabilidade fiscal e caos econ\u00f4mico, como alguns setores tentam falsamente apresentar, mas entre um modelo que subordina o social ao econ\u00f4mico e outro que integra ambas as dimens\u00f5es em um projeto coerente de desenvolvimento nacional.<\/p>\n
O tempo urge. As decis\u00f5es tomadas agora definir\u00e3o n\u00e3o apenas o legado deste governo, mas possivelmente o futuro da pr\u00f3pria democracia brasileira, num mundo cada vez mais tentado por solu\u00e7\u00f5es autorit\u00e1rias para problemas sociais complexos. \u00c9 hora de o presidente resgatar a ess\u00eancia que o tornou um s\u00edmbolo de esperan\u00e7a para milh\u00f5es de brasileiros: a capacidade de ouvir os anseios populares e transform\u00e1-los em pol\u00edticas p\u00fablicas efetivas. Os desafios s\u00e3o enormes, mas a hist\u00f3ria j\u00e1 mostrou que Lula \u00e9 capaz de super\u00e1-los quando consegue equilibrar o pragmatismo necess\u00e1rio \u00e0 governabilidade com a ousadia indispens\u00e1vel \u00e0 transforma\u00e7\u00e3o.<\/p>\n
O Brasil n\u00e3o precisa de um s\u00edndico, precisa de um estadista. E ainda h\u00e1 tempo para que Lula decida qual deles ser\u00e1.<\/p>\n
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Padre Carlos<\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"
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