Existe um velho ditado popular que diz: “santo de casa não faz milagre”. É uma daquelas frases curtas que carregam séculos de sabedoria popular e que se encaixam, com desconcertante precisão, em muitas das nossas realidades regionais. Mas e se estivermos, enfim, presenciando um raro momento em que esse santo resolve sim operar seu milagre? A recente visita do governador de Minas Gerais, Romeu Zema, à prefeita Sheila Lemos, de Vitória da Conquista, acende essa possibilidade.
Oficialmente, tratou-se de uma visita de cortesia. No entanto, nos bastidores, muito se comenta sobre tratativas envolvendo a saúde pública, especialmente no tocante ao atendimento de pacientes do norte de Minas, que há décadas buscam socorro em Vitória da Conquista — cidade baiana, mas que, na prática, atua como uma capital de serviços para essa região limítrofe e esquecida.
Fala-se do Vale do Jequitinhonha, uma das regiões mais pobres do país, tão carente quanto os rincões mais sofridos do Nordeste. Suas estradas são cicatrizes abertas no mapa, e sua população, resiliente, há muito aprendeu a driblar a ausência do Estado buscando socorro onde ele realmente funciona. E esse lugar, em muitos casos, chama-se Vitória da Conquista.
A cidade baiana, com seus hospitais de referência como o Esaú Matos, tem acolhido, tratado e, muitas vezes, salvado vidas vindas de solo mineiro. Enquanto o Estado de Minas por anos manteve-se inerte diante da evasão sanitária de sua própria população, Conquista agiu, atendeu, cuidou. Agora, com a visita de Zema, talvez estejamos diante de um gesto simbólico — mas também político — de reconhecimento.
Sim, porque reconhecer o valor de um vizinho que tem feito o que deveria ser sua obrigação não é apenas diplomacia: é também admitir um desequilíbrio estrutural e, quem sabe, começar a corrigi-lo. A pactuação entre estados e municípios, prevista pelo SUS, é um caminho legal e viável. Mas mais do que um instrumento burocrático, ela representa uma dívida histórica.
A expectativa é que esse encontro abra diálogos e soluções práticas. Que o “santo de casa”, por tanto tempo desacreditado, volte a ser respeitado. E que o Vale do Jequitinhonha, relegado às sombras administrativas, veja enfim um sinal de luz — ainda que venha da Bahia.
Porque, no fim das contas, o milagre que se espera não é divino. É público, humano, administrativo. E já passou da hora de acontecer.