O cenário político de 2024 trouxe surpresas amargas para o PT em algumas cidades estratégicas da Bahia, como Vitória da Conquista, Salvador e Feira de Santana. Em meio a derrotas significativas, a análise dos fatores que levaram a esses resultados tem gerado debates intensos sobre as novas realidades eleitorais e as estratégias adotadas. A mais recente derrota do deputado federal Zé Neto (PT) em Feira de Santana revela uma série de desafios que ultrapassam o simples embate entre candidatos.
Zé Neto, em entrevista após a sua derrota para José Ronaldo (UB), apontou a boca de urna e o fisiologismo como os principais responsáveis por seu revés. Segundo ele, a oferta de cestas básicas e o abuso do poder econômico nos dias finais de campanha foram elementos decisivos na votação. Contudo, essas alegações, mesmo sendo passíveis de discussão e de investigação, não podem ser vistas como o único fator que define o fracasso de uma candidatura.
Quando se observa o histórico de vitórias e derrotas em grandes cidades baianas como Salvador e Vitória da Conquista, fica claro que a estrutura política e o discurso tradicional do PT já não têm a mesma ressonância que tiveram em décadas passadas. Nessas cidades, o partido amargou derrotas humilhantes, resultado de uma crescente desconexão entre as lideranças petistas e as demandas de parte significativa do eleitorado. Os discursos que, em outros tempos, trouxeram mudanças progressistas, agora precisam ser renovados para se adequar a uma sociedade em transformação.
Zé Neto reconheceu que o “panorama da cidade” é diferente, mas sua avaliação parece focar mais nos mecanismos eleitorais — como a boca de urna e a compra de votos — do que em uma reavaliação profunda do próprio projeto político que foi ofertado à população. Claro, práticas como a compra de votos são absolutamente condenáveis e precisam ser combatidas em todas as instâncias. No entanto, não se pode reduzir o insucesso de uma campanha a esses fatores.
A derrota em Feira de Santana reflete algo maior. Não apenas em termos de fisiologismo e práticas ilegais, mas também em uma crise de identidade e discurso do partido. Em Salvador e Vitória da Conquista, a fragilidade do PT em se adaptar às novas demandas eleitorais ficou evidente, e Feira de Santana segue o mesmo caminho. Esses resultados, quando são tão expressivos e embaraçosos, não permitem justificativas simplistas. A estratégia de se apegar a questões pontuais, como a boca de urna, desvia a atenção de problemas estruturais mais profundos que precisam ser enfrentados com urgência.
2024 está revelando uma mudança clara nos modos operandi das campanhas eleitorais. Candidaturas tradicionais enfrentam uma nova realidade em que as bases eleitorais estão mais fluidas, os eleitores mais exigentes, e o acesso à informação mudou completamente a dinâmica do voto. A acusação de Zé Neto sobre as cestas básicas distribuídas às vésperas da eleição, apesar de alarmante, não pode ser o único ponto de atenção. O desafio vai muito além de combater ilegalidades; é preciso repensar o modelo de campanha, o tipo de proposta política apresentada e a forma de comunicação com o eleitor.
A declaração de Zé Neto de que “vai pra cima” após o resultado em Feira de Santana demonstra resiliência e disposição de enfrentar novos desafios. Porém, essa vontade precisa ser acompanhada por uma revisão estratégica profunda. O PT, que tantas vezes se mostrou à frente de seu tempo na formulação de políticas públicas, agora precisa se modernizar na arena eleitoral. As vitórias não serão conquistadas apenas combatendo a boca de urna ou práticas clientelistas. Elas virão quando o partido souber dialogar com um eleitorado cada vez mais diverso, crítico e exigente.
Feira de Santana, como segunda maior cidade da Bahia, é um palco estratégico para qualquer projeto político de poder. A derrota de Zé Neto acende um alerta importante para o PT, não só sobre as condições locais, mas também sobre o cenário estadual e nacional. A eleição de 2024, ao que tudo indica, será um divisor de águas para a estrutura partidária como um todo. Se não houver uma real introspecção e renovação, as derrotas em Salvador, Vitória da Conquista e agora em Feira de Santana podem se tornar apenas o começo de uma série de revezes ainda mais duros.
Conclusão
Zé Neto aponta problemas concretos, como a boca de urna e o abuso econômico, mas o resultado de sua derrota exige uma análise mais abrangente. O PT, se quiser voltar a ter relevância em cidades estratégicas como Feira de Santana, precisa ir além das desculpas pontuais e repensar sua estratégia, discurso e conexão com o eleitorado. A política está em constante transformação, e só sobreviverá quem souber adaptar-se a ela. O futuro do partido dependerá não apenas de “ir pra cima”, mas de como vai para cima e de que forma reconquista a confiança perdida.
Padre Carlos